Se algum dia me perguntarem qual é a melhor recordação de infância que tenho, direi que não sei. Não sei qual será a melhor, mas sei as que não esqueço. E não é tarefa fácil para quem tem uma memória de peixe, renovável a cada 5 segundos, para o bom ou para o mau. Uma das minhas preferidas são os domingos de inverno passados com a mãe e a irmã. E não tem nada de extravagante.
Assim que a época de caça abria, os fins-de-semana eram nossos. Das três. O domingo era o dia em que não fazíamos nada. E fazíamos tudo. Saíamos de casa ao final da manhã para tomar o pequeno almoço fora (já na altura eu tomava brunches, vejam lá). Depois, íamos escolher alguns livros de banda desenhada ao quiosque e desde a turma da Mónica ao HyperDisneys, nada escapava. Voltávamos para casa, onde abríamos o sofá-cama, com direito a lençóis e edredons quentinhos. E era uma luta para decidir quem ficava no meio. Cada uma de nós queria ficar no meio, mais pertinho das outras duas. E era a única altura em que ela nos deixava comer “na cama”. Entre livros, televisão, sestas, comida e risos o dia acabava. Mas não fazia mal porque sabíamos que na semana seguinte o ritual seria o mesmo.
Hoje em dia, prefiro ficar na ponta (está muito calor no meio), não leio banda desenhada (prefiro livros sem imagens) e já não espero pela época da caça. Mas sei que no dia de inverno que voltarmos a fazer qualquer coisa de semelhante, a sensação será igual à de há 20 anos atrás. E eu vou continuar a querer ficar no meio. Bem, talvez não que está calor, mas a intenção está lá. E talvez ela me faça batatas fritas.